POR UM SEGUNDO
A mulher gorda e maltrapilha viu aquele rapaz alto e de boa aparência no posto de gasolina, e pensou que com certeza ele poderia ajudá-la. “Por favor, você conhece alguma casa que tenha um quarto para alugar por aqui?” O rapaz estava ocupado lavando seu carro sujo de barro de tanto vagar pela cidade. “Não conheço, mas tem uma casa de apoio social logo ali na esquina, você pode tentar uma ajuda lá”.
A mulher subiu a rua com um nó na garganta.
Pouco antes de chegar ao local indicado, deu meia-volta e descendo rápido chamou o rapaz. “Eu não ia falar nada, não ia te perguntar isso, mas me achei no direito. Afinal, como você ficou sabendo do meu divórcio? Espalhou pra Deus e o mundo toda a minha história!”
“Eu não sei do que você está falando, eu não te conheço”.
“Pois saiba que essa é uma história minha e da minha família, não se intrometa nisso. É na minha vida que você está se intrometendo”.
O rapaz virou o rosto e disse mais uma vez, sem paciência, que não sabia de nada e nem estava entendendo o que ela estava dizendo. O frentista fez um sinal com a mão e completou, “É mais uma louca, solta daquele hospício do bairro. O sol anda derretendo os miolos das gentes”. E ela seguiu em frente, como quem já soubesse o que a esperava na próxima esquina.
O homem saiu em disparada. Desta vez ele ia conseguir achar a mulher. Não seria tarde demais. O filho pequeno chorava como nunca, já sentia a falta da mãe. “Nunca mais faço nada errado, prometo”. Ele seguia todos os passos dados por ela da última vez em que desapareceu sem deixar nem bilhete nem rastro. Passou por todos os bares, todas as esquinas, todas as casas de amigas, todas as igrejas, hospitais e necrotérios. Não conseguia achá-la. Sentiu-se pequeno, mesquinho e monstruoso por não vê-la realmente esses anos todos, mesmo quando ela estava ali, implorando para ser notada. Agora tinha sumido de vez, e só assim a mulher conseguira entrar em todos os poros dele e estar em todos os seus mínimos pensamentos. Finalmente.
Tinha cruzado o bairro pela milésima vez só naquele ano. Nos outros vinte que se passaram também. Agora o homem avistou de longe seu filho já crescido no posto de gasolina, cansado, lavando mais uma vez o carro cheio de barro, sujo de tanta procura vã. “Agora vou descansar meu rapaz, leve o neném pra casa. Chega de perambular por essa cidade cinza”. O rapaz concordou cabisbaixo, talvez nunca fosse conhecer a mãe. Já não sabia quem procurava, que rosto encontraria e que abraço arrependido receberia.
O homem seguiu em frente, andando devagar com os olhos perdidos no infinito, como quem já soubesse que o nada o esperava na próxima esquina. E por um instante não viu que uma mulher gorda e maltrapilha aproximava do seu filho...
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