Perceba que aquela mulher não fica mais chorando pelos cantos, sentada no escuro, ouvindo músicas comoventes para acelerar o pranto. Ela provou a si mesma que era capaz de converter sonho em realidade. Ela viu que poderia alcançar o amor e retê-lo. Depois de retê-lo, cozinhá-lo para que devagar, pudesse degustá-lo em seus lábios sedentos por açúcar.
Note que essa mulher já correu florestas, escalou montanhas, percorreu vales e sombras, nadou por oceanos inteiros, atravessou desertos e engoliu um rio caudaloso, até deitar na sombra de uma árvore. Lá ela pôde, enfim, descansar seu corpo da boa batalha enquanto gerava sua semente delicadamente escolhida.
Saiba que aquela mulher já teve vida suficiente para decifrar as esfinges das pessoas. Enxerga o coração nos olhos, a mente na boca, as intenções no movimento das mãos e a alma na cadência da respiração. Hoje já não perde tanto tempo com isso. Desfruta o ouro dos poucos.
Atente para o fato de que essa mulher já tem a carne batida pelo tempo e a pele um pouco ressecada do sol que ela tenta evitar. O sorriso ingênuo e aberto de outrora começa a perder um pouco a espontaneidade. Os olhos dela já não dançam naquele ritmo alucinado. Eles param de tempos em tempos quando querem ficar à deriva.
Veja que aquela mulher nem sempre sabe o que quer. Acha que nunca soube, e tem certeza que o que sabe, conquista. Ela aprendeu que pode mudar de desejo conforme o vento. Entendeu que alguns desejos não são fortes o bastante que a façam desistir do mais importante para alcançá-los. Enxuga as lágrimas e segue.
Escute que ela sabe do peso que carrega nos ombros e da magnitude daquilo que precisa empurrar no percurso dessa estrada, que ela espera ser longa de seguir. Não sabe quantos atalhos terá que pegar, ou quantas curvas derrapantes vai encontrar. Só está certa de que o amor escorrerá em tudo aquilo que construir.