sexta-feira, junho 30, 2006

INDEFINIDA

Busco a eternidade do que não sou
Entrego porções daquilo que não tenho
Vejo paisagens que nunca alcanço
Por isso vou...

Tenho tudo e não sinto nada
Sinto tudo, mas nada me pertence
Escuto o eco daquilo que me falta
E assim sou, a mim, revelada.

sexta-feira, junho 23, 2006

EU ME CRIANDO


Que destino foi esse que te trouxe para dentro de mim, que depois de longa espera, num segundo me transformou em eterna úbere fêmea?
Que vidas tantas são essas que você em mim depositou, que ainda não consigo saber ao certo se são minhas ou se são suas vividas através de mim?

Que sintonia é essa que me faz adivinhar seu chamado, minutos antes de você mesmo descobrir que precisa de mim?
Que força é essa que você me dá, que mesmo depois de esgotada a última gota de sangue das veias, continuo carregando o mundo e te fazendo parte dele?

Que sentimento é esse que você me provoca, que num segundo me sinto plena e no seguinte, amaldiçoada?
Que certeza é essa que você me passa, tão efêmera, que ainda não sei ao certo quando ela começa e quando acaba? E se um dia a tive...

Que contradição é essa que você me provoca, que ao mesmo tempo em que não posso viver sem sua presença, penso em nunca mais ser, existir, respirar você?
Que choro é esse o seu, que entra em cada poro do meu corpo, numa mistura de raiva e dó?

Que amor é esse que eu sinto, que me faz ver meus próprios olhos nos seus?
Que olhar é esse, que me emana estrelas, cometas e vulcões?

E que beijo é o seu, um estalo anestesiante, que sempre me faz implorar por mais um?
E que abraço é o seu, que procura meu corpo para se salvar dos males do mundo?
E sou eu sua salvadora, sou eu quem te protejo? Sou eu quem te cria?
É, sim, você: a minha cria que me cria.


sexta-feira, junho 09, 2006

A PUREZA DO ARTISTA



Alberto da Veiga Guignard é carioca de nascimento. Em 1896 ele nasceria em Nova Friburgo. Porém, seu coração escolheu Minas Gerais e aqui marcou uma época que reverbera até hoje. Em 1944 mudou-se para Belo Horizonte e fundou a Escola Municipal de Belas-Artes, primeira escola de arte moderna da capital, onde exerceu grande influência sobre as gerações mais novas. Ligou-se profundamente às cidades mineiras de tradição barroca colonial, como São João del Rei, Sabará e particularmente Ouro Preto, onde passou a residir em 1960.
O contato com a arte colonial e os ares mineiros foi decisivo para a obra de Guignard. Seu estilo absorveu sem exageros as sinuosidades do barroco. As cores, em pinceladas leves, impressionistas pelo espírito e diluídas como aquarelas, sugerem a atmosfera límpida do planalto mineiro e a poesia que emana de suas velhas cidades. Com uma inclinação por temas populares, cujo lirismo e a pureza o aproximam dos artistas ingênuos, Guignard é considerado um dos mestres da pintura moderna brasileira.
No mesmo ano em que Guignard criava a hoje chamada Escola Guignard, acontecia em Belo Horizonte a primeira Exposição de Arte Moderna de Minas Gerais, reunindo Anita Malfati, Tarsila do Amaral, Alfredo Volpi, Portinari, Di Cavalcanti e Lasar Segall. O mestre formou uma importante geração de artistas plásticos como Amílcar de Castro, Chanina, Maria Helena Andrés, Sara Ávila, Yara Tupinambá e Wilde Lacerda.
Daqui dessas montanhas, afinal, só poderiam nascer artistas de renome internacional. Quem teve Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, como um dos seus primeiros mestres e exemplos, não foge ao chamado da arte. E se ainda fosse só Aleijadinho... Pois Manoel da Costa Athaide, o Mestre Athaide também deixou preciosidades nessa terra. Assim como João Nepomuceno Correia e Castro, Joaquim Gonçalves da Rocha e muitos outros que permanecem no anonimato por falta de documentação que lhes ateste a autoria.
O presente em Minas parece ser tão assustadoramente inspirador quanto seu o passado. Prova disso são as obras únicas em beleza de Petrônio Bax, Carlos Bracher, Fernando Lucchesi, Jorge dos Anjos, Marco Túlio Resende, Rosângela Rennó, Isaura Pena, Orlando Castaño e tantos outros.
O artista soberano nasce de quem menos se espera. Minas Gerais constantemente é prova e nascente disso. De um construtor de andaimes, um granjeiro, pintor de paredes ou um único homem que reúna todas as profissões num só gesto, ele nasce. Assim era Amadeu Lorenzato, que disse numa entrevista certa vez quando perguntado qual o seu estilo “Eu nem sei que estilo que é. É pintura! Dizem que é primitivo, que é ingênua, que é surrealista, eu não sei... Eu pinto aquilo que vejo, que me interessa.”


Este texto é parte da reportagem especial sobre cultura publicada na Revista Sagarana número 23. Clique aqui e visite o site da Revista.

sexta-feira, junho 02, 2006

EM MIM


Queria que você fosse invisível,
e que eu pudesse te levar aonde quer que eu fosse.
Que fosse disponível, como um batom,
que eu tiraria da bolsa quando ninguém estivesse olhando.
Que fosse inofensivo, como uma flor,
e eu pudesse te sorver num jardim que não fosse o meu...
Queria que a todo momento você sussurrasse em meu ouvido,
palavras proibidas, enquanto se embriaga com meu perfume...
Se você fosse pequeno e imperceptível como uma borbulha de um champagne,
ou a lufada do vento que percorre meu corpo,
eu poderia te aceitar e te sentir, sem precisar me mover.
Queria que você fosse o ar que eu respiro...
Só assim você poderia estar dentro de mim,
sem que eu precisasse te pedir...
Talvez se o tempo parasse entre nossos olhos,
Eu poderia ver nossa história acontecer novamente...
Queria que você fosse nada mais do que um filme romântico,
Que eu pudesse assistir à sua melhor parte... infinitas vezes...
Queria saber onde está você, onde estou eu, onde está a paixão...
Afinal,
Sou eu que te amo ou é o amor que me escolheu?
Me apaixonei por você ou pela parte de mim que existe em você?
Quero mesmo você, ou mim mesma idealizada?
São seus olhos que vejo, ou meus melhores olhos nos seus?
Como me achar em você, se seus olhos não são os meus?
Queria que você fosse completamente Eu,
para que fosse comigo e me definisse...
Aonde quer que Eu fosse,
Sem que Eu mesma soubesse.