domingo, outubro 29, 2006

CARTA A DRUMMOND


Deixa eu te contar então, Carlos drummond de Andrade, como comemoramos os seus 104 anos de idade. Sei que você adorava recitar suas próprias poesias, já ouvi inúmeras gravações de seus textos em sua voz doce e suave. Sei ainda que você adorava um bom sarau de poesia. Na sua época sim, isso era muito comum. Hoje, o mundo anda corrido, quem tem tempo para isso?

Pela segunda vez organizei um Sarau de Poesias no Café de Deus. Desta vez foi mais cheio e mais longo do que o primeiro, que foi em homenagem a Mário Quintana. Você teria adorado esse também.
Ontem, ficamos horas recitando suas poesias Drummond, trocando seus livros, passando uns aos outros suas palavras, de mesa em mesa. Copiando trechos, trocando impressões.
Pessoas de todos os tipos estiveram lá porque amam sua poesia, Drummond... Até criancinhas pequenas que nunca tinham lido nenhuma poesia antes, pegaram um livro seu e leram em alto e bom som. Você acharia que esse sim é um jeito maravilhoso de comemorarmos seu aniversário. Sei disso. Tornando-te vivo.

Escolhi várias poesias para levar para o público ler. Lembrei de vários momentos da minha vida ao relê-las. Cada vez que achava alguma importante, tinha a impressão que tinha encontrado a minha escolhida. Não tenho uma preferida definitiva, concluí. A cada momento, uma poesia vem e me arrebata de tal forma que naquele instante ela é minha. Naquele instante ela me falou, me tocou, me definiu e me transformou.
Desta vez foi essa:

"A palavra mágica

Certa palavra dorme na sombra

de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
A senha do mundo.
Vou procurá-la.
Vou procurá-la a vida inteira

no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.
Procuro sempre, e minha procura

ficará sendo
minha palavra."

Drummond, como você é múltiplo! Profundo, universal e atual! Começamos tímidos, em voz baixa e sem tantas interpretações, até chegar nos seus textos eróticos depois de algumas taças de vinho. Você provoca e emociona.
Só você consegue escrever sobre qualquer assunto de forma delicada, marcante, linda e pungente.
Senti sua presença nesse dia, como uma comemoração de aniversário de verdade, onde o mais importante é aquele que deu a festa. E foi, você, Carlos - agora sei que posso te chamar assim - quem esteve lá, mais do que todos.
Obrigada,
Um abraço de quem te admira e te tem sempre na cabeceira da cama,
Carol.


Agradecimentos:
Arraial, Café de Deus, Da Roça Uai, Vera Casa Nova (convidada), Fernando Grilo (fotografia), Distribuidora Acaiaca - Editora Record (doação de livros pro sorteio) e Jornal Estado de Minas (divulgação)

domingo, outubro 22, 2006

Coisas que não quero esquecer do seu segundo ano de vida



Aquele dia em que você grudou no meu pescoço por horas, sem que eu te pedisse, e me beijou sem parar;

O seu jeito de pegar na caneta e no lápis, como se já fosse um verdadeiro escritor;

Seus gritinhos quando a gente passa dentro de um túnel;

Sua risada gostosa quando eu te faço “cosquinha”;

O primeiro dia em que você viu seu cocô no chão, pegou e trouxe para o papai dizendo: “bombom!”

Como é maravilhoso tomar banho com você, sentindo sua pele gostosa de bebê na minha pele debaixo do chuveiro;

Quando sua professora contou que um coleguinha foi visitar a escola num dia chuvoso. Ele ia embora se esquecendo do guarda-chuva, e espontaneamente você correu atrás dele para entregá-lo;

As primeiras músicas que cantamos juntos: “Quem quer pão”; “Meu pintinho amarelinho” e “A dança do passarinho”;

A sensação de ter você enroscado na minha perna quando estou de pé (você ainda é do tamanho delas);

Como foi sublime aproveitar a praia com você. Manhãs inteiras de quietude e felicidade;

Suas primeiras palavras difíceis e sua maneira graciosa de dizê-las: "tratooor... papel... Antôniooo... "

A memória que você tem para saber sempre quem te deu cada presente, e ao ver o objeto gritar o nome da pessoa que te presenteou;

Aquela vez que você gritou “vê ! vê !” logo depois que seu pai tirou uma foto sua. Você correu até ele e virou a câmera para ver o visor;

Quando você resolve imitar minhas broncas ou morre de rir das minhas gracinhas;

Ver a sua educação ao pegar um papel higiênico que estava no chão do banheiro e passar na borda da privada para enxugar o xixi que respingou. Bom exemplo do papai;

Olhar sua alegria num pula-pula ou quando ganha uma bola ou um balão;

Ouvir sua voz me procurando pela casa;

Quando você olha uma mulher linda na televisão e diz: “Mamãe!”

O momento em que você bateu palmas depois que te cantei uma música;

Os mil gols que já marcamos juntos;

Saber que você me ama plenamente e – por enquanto – me acha a pessoa mais perfeita do universo;

Quando você, finalmente, no fim do dia, adormece em meu colo e eu te aconchego em meus braços antes de te pôr pra dormir.

segunda-feira, outubro 16, 2006

INDICAÇÃO A PRÊMIO

Leitores,
Estou concorrendo ao blog da quinzena no BLOG NEWS.
Cliquem nessa figura abaixo para votar.






Valeu!!!

sexta-feira, outubro 13, 2006

AINDA É TEMPO




Ainda é tempo, amor
De olhar as flores
Caminhar pela areia
Sentir o sol
Abraçar seu calor

Ainda é tempo, paixão
De colher nossos frutos
Plantar outros tantos
Dar as mãos para o mundo
Arar esse chão

Ainda é tempo, querido
De chover palavras
Secar espinhos
Entrar neste furacão
E perder o sentido

Ainda é tempo de se jogar
Encarar o precipício
E com você
Voar...
Voltar ao início

sexta-feira, outubro 06, 2006

Nasce um atleticano, ou melhor: Nascem dois!

Sempre estranhei o fato de que o meu marido, Fernando, não tivesse um time. Se alguém perguntava: “Você é o quê?” Ele dizia: “Ah, não sou nada não...” No começo eu gostei de ter achado essa espécime rara de homem, que não troca a mulher por uma partida de futebol, que não fica discutindo esse assunto o tempo todo, que não fica mal humorado quando perde e nem permanece com os olhos pregados na televisão no sábado à noite, enquanto eu passeio de calcinha pela sala.
Fui, então, me esquecendo do meu time, me afastando do campo de futebol e perdendo um pedacinho do que eu sou por causa disso. A ineficiência dos jogadores também ajudou, claro. Fica fácil não ligar para futebol quando tudo dá errado e o time vai parar na segunda divisão...
Tudo mudou quando o nosso baixinho aqui de casa resolveu ter um caso de amor inseparável com a bola. Mudou mais ainda quando todos que o viam jogando começaram a notar uma habilidade, precisão e força natas no chute dele, antes mesmo do pequenininho completar dois anos de idade. Se transformou de vez quando ele resolveu a chutar tudo o que é redondo que vê pela frente e a falar “bo-la bo-la” até quando está dormindo.
Quem joga bola precisa de um parceiro, e ele joga de manhã, depois do almoço, quando acorda de tarde e depois do banho à noite, só pra relaxar, nada muito sério, só alguns chutes a gol. Quem ama tanto o esporte sem nem entender ainda seu significado, e leva a bola pra onde quer que vá, não pode ficar sem um time. Não podíamos mais ficar indiferentes ao futebol.
Tirei da gaveta o uniforme preto e branco empoeirado que meu menininho ganhou dos avós quando nasceu. Sem falar nada com o pai, que supostamente não gostava do meu time, eu corajosamente vesti meu filho, definindo assim sua escolha.
O pai não falou nada, e saiu com ele no colo para comprar pão. Voltou meio sem graça e com um visível desconforto marcado no rosto. “Quase fui linchado na padaria. Ninguém se conformou em ver um menino tão bonito torcendo por um time que só perde!” Eu fiquei dizendo que ele deveria ter retrucado as provocações que vieram dos nossos rivais. Mas, logo me dei conta de que ele não sabia, nem tinha costume e bagagem para fazer isso.
Ainda não sabia como resolver esse impasse, mas esperei um momento de inspiração. E veio a luz: ele tem que se tornar um atleticano! Mas, como? Tem que ser convencido disso... De forma alguma meu filho veste uma camisa azul e branca!
Chegou o fim de semana, almoço na casa dos meus pais. Meu irmão se preparava para ir ao Mineirão com meu pai. Sem mais nem menos eu disse: “Pai, que tal você comprar o Fernando?” “Como assim?” “Faz com ele o que você fez com seu irmão, dá algo em troca pra que ele escolha torcer pelo Galo!” Ele abriu um sorriso malicioso.
Fernando se animou pelo simples fato de que ele ia ganhar algo nessa transação e resolver uma questão pendente. A moeda de compra não poderia ser outra senão a cerveja. A negociação começou modesta: “Cerveja de graça o fim de semana todo!?” "Cerveja de graça o mês todo?" “Não! Cerveja de graça até o fim do ano!” "Fechado".
Foi um corre-corre danado. Alegria geral! Busca camisa oficial, ensina o hino do Atlético, dá os toques de como torcer, macetes de como revidar as provocações do torcedor adversário, e finalmente a prova final: o Mineirão.
Mas, aconteceu o que eu temia. Será que eu teria criado um monstro? Rapidamente meu marido me trocou por uma partida de futebol, sem se esquecer do aquecimento, duas horas antes da partida, que incluiu muitas cervejas e o famoso Feijão Tropeiro. Quando dei por mim, Fernando já era atleticano e acenava em despedida num carro tomado pelas cores preto e branco.
Voltou do jogo rouco de tanto gritar, com um sorriso alvinegro, que desde então não tira mais do rosto. A não ser quando vai gritar a plenos pulmões quando o nosso filho marca um gol: Galooooooo !