sexta-feira, dezembro 14, 2007

EXCÊNTRICO SORVETE




Um mestre sorveteiro italiano elevou o sabor do sorvete a níveis que eu nunca antes tinha imaginado. Mario di Rauso me recebeu para uma entrevista na Alessa Gelato em Belo Horizonte essa semana. Já estava muito bem impressionada com o lugar, projetado pela simpática arquiteta Andréa Manetta, a proprietária da sorveteria. Tudo de muito bom gosto, jovem e moderna, nem parece uma sorveteria. Tanto que nós demos duas voltas no mesmo quarteirão antes de confirmar que a Alessa era mesmo lá. O inesperado realmente não pára de acontecer naquele lugar.
Como uma apaixonada por sorvetes, adorei a pauta cair na minha mão, e fui para conhecer os sabores mais exóticos de lá. Andréa me contou a história e o conceito do lugar me fazendo experimentar praticamente todos eles. Os de fruta parecem que foram colhidas naquele momento - o aroma salta nas suas narinas instantaneamente; os de chocolate são inenarráveis e os de amêndoas, nozes e avelãs uma coisa de louco.
Tive uma estranha sensação de que a partir daquele momento só poderia tomar daquele sorvete e nenhum mais, de tão impressionante o sabor. É fato que esse gosto me levou de volta á Itália, país-romance, onde passei minha lua de mel. Todos os dias tomava um gelato porque sabia que era impossível levá-los comigo ou encontrá-los no Brasil. Agora eu reencontrei os sabores daquele amor inesquecível.
Quando Andréa contou que mandou vir da Itália, um mestre sorveteiro que tem uma tradição secular na família, fiquei louca para conhecer a história dele. Só há vinte anos, Mario resolveu fazer o que o avô fazia nos idos de 1900. Achou um caderno com as receitas dele guardado num baú velho e esquecido. Ninguém na família tinha seguido sua profissão, mas isso não impediu que ele tivesse esperança que um dia isto acontecesse.
O avô de Mário viveu numa época em que não existiam geladeiras. Ia para o alto de uma montanha, em pleno inverno, para colher a neve que depois guardava numa cova coberta com palha. Incrivelmente, a neve durava até a primavera e o verão, quando ia para as praças vender o gelato.
O gelo da neve servia para conservar (e envolver) um grande sino, onde ele colocava o líquido que ia congelando aos poucos nas bordas. Ele girava o sino, raspava o que congelava, e assim, estava pronto o sorvete.
Ouvi essa história tomando um sorvete chamado Zabaione, feito com vinho marsala – um vinho fortificado típico italiano. O queixo só não caiu porque estava ocupado...
O tempo passou, mas o neto continua fazendo as receitas do avô com o mesmo cuidado artesanal, com uma ajudinha da tecnologia.
Mario conta essa história com tanto orgulho, que tenho certeza que esse amor pelo avô, sua família e sua terra transbordam em cada naco gelado que produz aqui no Brasil. Lugar, aliás, que ele não quer mais largar, depois de provar, entre outras coisas, nossas frutas tropicais mais saborosas.
* A matéria mesmo sobre sabores exóticos só no mês que vem na Revista Encontro

quinta-feira, dezembro 13, 2007

AUGE DO ÉDIPO


Estávamos brincando felizes e contentes em casa: eu, maridão e filhinho.

O clima estava tão animado que falei pro maridão: Vamos dançar? E ensaiamos uma valsa meio cômica. Imediatamente, Davi grita:

__ Não dança! Não pode dançar!

Paramos imediatamente e perguntamos:

__ Mas porque não?!?

E ele responde:

__ Porque ela é TODA minha!


Precisa dizer que eu derreti??

terça-feira, dezembro 11, 2007

ALIMENTO DA ALMA

Ele sente o ar entrando profundamente em seus pulmões e se espalhando por todo corpo. Essa respiração profunda entra em sintonia com as batidas do coração, no mesmo ritmo dos seus pés, que minImamente tocam o chão. Sente que vai entrar em outra dimensão, esquece dos problemas e simplesmente assiste a tudo ao seu redor passar em alta velocidade. Em poucos minutos já não sente mais nada: está completamente anestesiado. Assim, ele corre.
Efeitos e sensações, que mais parecem resultado do consumo de alguma droga ilegal, que um corredor de 40 anos se diz dependente. Há uma década, o publicitário Petter Garrido corre nas ruas de Belo Horizonte todo santo dia. Hábito que vem conquistando mais e mais adeptos. Basta olhar as praças, parques e avenidas da capital mineira e vê-los suados, plugados em um ipod e com muita pressa.
A tradicional Volta Internacional da Lagoa da Pampulha, que reúne todo dezembro milhares de corredores, contribuiu para esse crescimento e hoje não está mais sozinha: divide espaço com aproximadamente duas corridas de rua por mês, entre elas a Super 40, Nutre, Sesc e Cemig e dos Correios.

  • Parte do texto originalmente escrito para reportagem de capa da Revista Encontro que não foi publicado, ou seja, editado.

quinta-feira, dezembro 06, 2007

ERRO, LOGO EXISTO

Ao assistir ao último espetáculo da turnê super elogiada de "Um Boêmio no Céu" com José Mayer fiquei a pensar na vida. A peça nos faz pensar em muitas coisas, como a beleza da nossa língua, o humor singelo feito no norte e nordeste do país, as lindas composições de Catullo da Paixão Cearense e que as melhores coisas da vida são aquelas pequenas e tudo aquilo que a natureza nos dá de presente.
No final do espetáculo, ao agradecer as palmas, José Mayer tropeçou numa grande cadeira do cenário e quase caiu. Ele justificou dizendo algo como: "Eu sabia que apresentar na minha terra, para minha gente ia me desestabilizar de alguma forma".
O fato arrancou mais palmas ainda da platéia. E pensei que realmente é algo recorrente em espetáculos de teatro. Se o ator erra, engasga, esquece, pula, cai ou faz qualquer coisa fora do script, a reação é sempre positiva. Muitos risos extras ou palmas.
Se o palco é um recorte da realidade, representação da vida, afinal, como seria bom que aqueles que nos assistem errar, ao invés de nos crucificar - só pra variar - resolvessem enxergar algo de beleza na nossa imperfeição...
Se a platéia já consegue no teatro, acho que ainda há esperanças.